28 julho, 2020

CRUELDADE: Antônio não abrirá mais as portas do bar em Roncador

Pela manhã do 22 de julho, seo Antônio acordou cedo. Ele não sabia. Mas seria a última vez que abriria as portas de madeira do seu velho bar. Pioneiro em Roncador, não oferecia perigo a ninguém. Ao contrário. Aos 75 anos de idade, além de muito conhecido, era respeitado. Principalmente, pela boa convivência com a comunidade. Com uma boa prosa no balcão, tinha clientes assíduos. Era um sujeito do bem. Mas a prosa não será mais ouvida. Ela foi brutalmente calada com a entrada de dois homens ao estabelecimento. Na tentativa de roubá-lo, também o mataram. Foi morto na cozinha. E as portas não se abriram mais.

O crime chocou a pequena Roncador. A cidade ficou muda. Perplexa diante de tanta crueldade. Segundo a família, os assassinos levaram R$ 275, três maços de cigarro e o único bem terreno de Antônio: um Fusca ano 80 e poucos. O xodó do comerciante. Horas depois, já à noite, policiais identificaram o carro nas ruas de Campo Mourão. Os dois suspeitos foram detidos. No interior do “Fuka” estavam pertences do senhor e uma camiseta com marcas de sangue. Para a polícia, outras duas mulheres e outros dois homens também são suspeitos da participação no crime.



Antônio Vieira de Jesus veio ainda novo de Curitiba. Chegou a Roncador cheio de planos. Primeiro labutou na lavoura. Com o tempo casou e abriu um bar. Pelos anos 90, já separado, decidiu ir embora para Cuiabá. Teve outro casamento. Ao todo foram sete filhos. Nas terras matogrossenses, virou sorveteiro. Sempre teve uma vida dura. De trabalho. Nunca foi rico. É como dizem pela cidade: Os Vieira são gente forte.

Por volta de 2000, já separado pela segunda vez, retornou a Roncador. Tinha carinho pela cidade. Então, sozinho, montou o segundo bar, na Vila Anchieta. Um imóvel de madeira de sua irmã. Pintado na cor azul. Não pagava aluguel. Aos fundos, mantinha um quarto e uma cozinha. Vivia tranquilo. Não devia nada a ninguém. Mesmo com filhos e sobrinhos, optou por viver só. Era como gostava. Um sujeito organizado. Com boas atitudes. Tudo no bar estava no devido lugar. E o terreno ao redor, continua limpo. Sem mato. E, ainda, varrido das folhas de árvores. Até parece que, após sua morte, o tempo por lá parou.

Vizinhos contam que se tratava de um senhor quieto. Meio introvertido. De poucas palavras. De acordo com um sobrinho, que preferiu não ter o nome revelado, os filhos pediam para que Antônio fosse embora, morar com algum deles. Mas nunca aceitou. ‘’Nós mesmos, daqui de Roncador, já havíamos oferecido uma casa pra ele. Também jamais quis’’, disse. Os convites não eram à toa. Antônio, pela idade, já havia sido agredido num outro assalto. Foi em 2018. Levaram dinheiro e o machucaram.

O sobrinho lembra de um tio valente. ‘’Ele não tinha mais forças. Mas nunca deixou de ser valente. Possivelmente, tentou enfrentar os criminosos nas duas vezes’’, disse. Relatos indicam que os assaltantes chegaram ao bar por volta das 17h. Permaneceram uma hora no interior. Tempo suficiente para roubar, matar e levar o Fusca. Foram seis facadas. Golpes cruéis demais. Ali, naquele momento, os criminosos encerraram uma vida inteira.

Ainda chocada com a brutalidade, a irmã de Antônio, Vitória, não quis falar sobre o irmão. “Só quero guardar as boas lembranças com ele”, disse. Um dos filhos, Vanderlei, revelou que tinha no pai um amigo. Um parceiro. “Ele tinha sua vida e gostava do canto dele. Recentemente esteve no Mato Grosso. Ficou uns 30 dias. Tentamos fazer com que ficasse. Mas a vontade de ficar no seu canto foi maior”, disse. Pouco tempo depois, a tragédia aconteceu. O filho ainda não entende tamanha raiva. “Podiam ter roubado. Mas deixassem meu pai vivo. Foram seis facadas. Estavam com muita raiva”, revelou. Para ele, os criminosos já haviam planejado a ação.

Seo Antônio era aposentado. Na verdade, nem precisava mais trabalhar. Afinal, guardava a grana. Era um cara seguro. Mas tinha a necessidade em trabalhar. Gostava de labutar. De acordar cedo. Arrumar o bar. Varrer o terreno. Eram particularidades só dele. Por isso insistia em ficar só. Mas agora, as portas de madeira não abrirão mais. Dia 22 de julho, foi o último ato. Resta agora que a justiça faça a sua parte. É o que a família pede.


REDAÇÃO: Por Dilmércio Daleffe - Tribuna do Interior


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